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O espelho de um riso que revela a hipocrisia da sociedade

Um olhar capacitista revela mais sobre quem vê. Foto: Divulgação.

Não entendo. Não entendo por que a sociedade ainda insiste em rir da pessoa com deficiência. Rir não de uma piada, não de uma graça, mas da própria existência. Riem porque o corpo não se encaixa nos padrões impostos. Riem porque a forma de ouvir, de se mover, de se comunicar ou de usar uma tecnologia assistiva não corresponde ao que chamam de “normalidade”.

Esse riso não é inocente: é ironia, é julgamento, é violência. É a forma mais cruel de dizer que alguém não pertence. O riso escancara o que muitos preferem negar — vivemos em uma sociedade hipócrita e capacitista, que prega inclusão nos discursos, mas cultua em silêncio a exclusão.

E então me pergunto: será que, no fundo, eles não estão rindo de si mesmos? Rindo da própria crueldade, da arrogância de se julgarem superiores apenas porque seus corpos se enquadram num padrão fabricado? Porque são os meios de produção capitalistas que definem o que deve ser admirado e o que deve ser descartado. O corpo perfeito vira mercadoria; o corpo diferente, motivo de escárnio.

Aqueles que sorriem hoje da condição ou das características de uma pessoa com deficiência se esquecem de que amanhã podem se tornar parte dessa mesma parcela da sociedade. “O mundo não gira, ele capota”, já diz o ditado popular — e a ironia do riso de hoje pode, rapidamente, se voltar contra quem o pratica.

Mas o que incomoda tanto? Que alguém com deficiência ouse sorrir de volta? Que exista felicidade fora dos moldes publicitários? Que se prove, a cada gesto, que dignidade não depende de aparência?

O riso da sociedade é, na verdade, um espelho que revela sua própria miséria moral. Porque rir da diferença é rir da humanidade que a todos pertence. E nesse riso vazio, o que se denuncia é a incapacidade coletiva de aceitar que a diversidade é parte essencial da vida.

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