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Uma Chance: O Filme Que Podemos Realizar

Pessoa em cadeira de rodas assume o centro das atenções em um filme que desafia limites. /Foto.

A cena começa com um close, nas mãos de alguém digitando. O som das teclas é ritmado, como um relógio marcando o tempo. O texto no computador pulsa: “Dar uma chance a uma pessoa com deficiência…” — e então, pausa. O escritor para, olha para a tela, suspira e coça a cabeça. 

— Não, não, não… Isso está didático demais. — Reclama consigo mesmo. 

A câmera dá um zoom-out. Ele está cercado por pilhas de livros, roteiros antigos, xícaras de café meio cheias. Na janela ao fundo, a cidade segue em seu ritmo. Ele pega a caneta, faz um rabisco no caderno e murmura: 

— Vamos contar a história da Marta. 

Corte para a primeira cena imaginada. Marta, 28 anos, entra em uma sala de entrevistas. Ela usa uma cadeira de rodas, o que faz o entrevistador erguer levemente as sobrancelhas, como quem já tomou sua decisão antes mesmo de ouvir qualquer palavra. A câmera foca no rosto dela, sereno, mas com uma centelha nos olhos que revela que ela já viu essa expressão muitas vezes antes. 

O escritor para novamente. 

— Não, clichê. Preciso de algo mais real, algo que prenda. 

Ele levanta, anda pela sala, pega um livro de roteiro empoeirado. Folheia, mas não encontra o que procura. O telefone toca ao fundo, ele ignora. A história precisa sair. 

— Ok, vamos direto ao impacto. 

A próxima cena ganha forma em sua mente: Marta já conseguiu o emprego. Ela está em seu primeiro dia, cercada de olhares curiosos. Um deles, mais demorado, vem de Marcos, um funcionário que resmunga algo como: “Mais uma dessas contratações pra preencher cota.” Marta ouve, mas não reage. Ao invés disso, segue para sua mesa e começa a trabalhar. 

O escritor sorri. Agora está fluindo. Ele escreve rápido, as cenas se encadeiam. Marta mostrando sua competência, sua criatividade. Marta quebrando preconceitos sem discursos, apenas com ações. Há uma cena poderosa: Marcos, o mesmo colega, está travado com um problema que ninguém consegue resolver. Marta, calmamente, encontra a solução. Quando Marcos a agradece, ainda constrangido, ela apenas responde: 

— Todo mundo merece uma chance, não é? 

O escritor ri baixinho. Ele sabe que o diálogo é óbvio, mas funciona. 

— E agora… o clímax. 

A câmera volta para Marta. É sua apresentação final, a chance de provar a todos que ela não só merece estar ali como também faz a diferença. Ela fala com confiança, o auditório atento. A música cresce no fundo, pontuando cada palavra. Quando termina, aplausos. Mas o que importa não são as palmas; é o sorriso de Marta ao sair da sala, sabendo que conseguiu, mais uma vez, mostrar quem ela realmente é. 

O escritor fecha o notebook satisfeito. Ele não precisa de efeitos especiais, nem de um orçamento milionário. A história é simples, mas poderosa. Uma história que deveria ser óbvia, mas que ainda não é. 

Ele pega o celular e envia uma mensagem: Tenho um roteiro novo. É sobre dar uma chance. Você vai gostar. 

Ao fundo, a cidade continua seu ritmo caótico. Mas, naquele pequeno escritório, alguém acabou de abrir uma porta. Talvez seja apenas a porta de um filme. Ou talvez, sem perceber, tenha aberto a porta para uma conversa maior — sobre inclusão, respeito e o impacto de acreditar nas pessoas. 

E aí o filme termina. Mas o roteiro da vida, esse continua, continua, continua.

Dar uma chance a alguém com deficiência não é só um gesto de boa vontade, é um reconhecimento. Por trás de cada pessoa há um universo de talentos, sonhos e forças que, muitas vezes, são ignorados. Enfrentamos o mundo com uma resiliência que poucos têm. Cada desafio superado se transforma em aprendizado, cada obstáculo vencido em um tijolo na construção de uma personalidade extraordinária.

Marcações:

1 comentário em “Uma Chance: O Filme Que Podemos Realizar”

  1. Senhora D'Assunção Batista da Silva

    Boa tarde lindo texto.Sensivel e realista ao mesmo tempo. Pois não é a cadeira de rodas que nos caracteriza. Todo ser é único no universo. Cada um com sua peculiaridades.Pois sabemos que todos nós temos algo importante para oferecer. Talvez a incredibilidade entre as pessoas que impeça esse lindo desabrochar!!!

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